Camp Rock 2: 'A batalha pela pureza'
Na colônia de férias Camp Rock, os jovens aprendem a cantar e aconviver. Há dois anos, no filme "Camp Rock", do Disney Channel, Mitchie (Demi Lovato) e os irmãos Shane, Nate e Jason Gray (Joe, Kevin e Nick Jonas) eram meninos que queriam aprender música. Agora assumem o posto de monitores e têm uma missão: vencer o acampamento rival, o supertecnológico Camp Star, que acaba de se instalar do outro lado do lago. "CAMP ROCK 2: THE FINAL JAM", que estreia nos Estados Unidos na sexta-feira dia 3 e no Brasil no dia 7, às 20 horas, põe em jogo a pureza de princípios contra a manipulação de imagem e a superprodução. Um conflito que a Disney sempre enfrentou.
Os dois acampamentos vão se defrontar em um programa transmitido pela televisão local. Mitchie e os amigos não dispõem de recursos tecnológicos. Contam somente com talento e suor. Muitos integrantes do Camp Rock se deixam seduzir pelos recursos de última geração que o empresário Axel (Daniel Kash) diz ter no Camp Star e se bandeiam para lá. É o caso da loirinha Tess Tyler (Meaghan Martin). Rival de Mitchie, ela se junta ao rapper Luke (Matthew "Mdot" Finley) para montar um espetáculo que contém elementos até tão estranhos à estética Disney, como hip-hop e dança de rua. O resto da trama é preenchido por namoros e duetos entre Mitchie e Shane e Nick e Dana (Chloe Bridges), filha do dono do Camp Star. Música ou sinceridade? Na verdade, não importa quem tem mais talento, sucesso ou ambição. No fundo, ensina o musical, todos são bons meninos. Que vença o mais preparado. Leia-se: os maus. O charme dos vilões tem um lugar de destaque nesses musicais, como de resto em todas as produções da Disney. É o charme do poder e da fama. E que o mais puro e inocente se sinta feliz.
"Camp Rock 2" quer trazer uma lição de valores positivos embalados em números e canções que fixam na memória. Pode também ser visto como um espelho da maneira como o estúdio atua na formação das crianças e dos adolescentes. "Camp Rock 2" simboliza a competição entre o que a Disney é e o que ela gostaria de ser. A ética do Camp Rock tem sua outra face no Camp Star. O canal de Mickey fabrica estrelinhas para desová-las no mundo pop tão logo se tornem adultas. Atua aparentemente como o Camp Star, que produz mão de obra para indústria de celebridades. Mas também transmite valores como liberdade de expressão, liderança, esforço conjunto e sinceridade. É cantar e dançar para crer.
O lançamento de "Camp Rock 2" lembrou mais uma apresentação do Camp Star que a cena idílica de uma colônia de verão. Às 17 horas da quarta-feira 16 de agosto, uma grande área nas imediações do Lincoln Center foi isolada para a passagem do elenco de "Camp Rock 2" pelo tapete vermelho. O filme ia ser exibido em pré-estreia no Alice Tully Hall, um dos teatros mais suntuosos da cidade. Dezenas de milhares de adolescentes empunhavam cartazes e gritavam por Demi e pelos Jonas Brothers. À medida que o elenco desfilava (mesmo os coadjuvantes mais obscuros eram aplaudidos), os gritos aumentavam e as emissoras de rádio e televisão corriam pra obter depoimentos de quem quer que fosse. Até eu, que estava lá para cobrir o evento, entre muitos outros jornalistas internacionais, concedi entrevista a um canal colombiano. Minha declaração foi um tremendo chavão. Como que contaminado pelo espírito Disney, disse que a histeria fazia parte da expectativa em torno de um dos produtos de maior sucesso da televisão, que deveria se tornar um dos sucessos do ano, com repercussões em produtos como a trilha sonora em CD e DVD.
Há motivos para a estimativa. O primeiro "Camp Rock" foi o filme mais visto em canal por assinatura em 2008. Arrebanhou 137 milhões de espectadores no mundo todo. A trilha em CD vendeu 2,5 milhões de cópias. E o DVD do filme foi o mais vendido e alugado dos Estados Unidos. O sucesso de "Camp Rock" estabeleceu o gosto do público tween - pré-adolescentes de 8 a 14 anos - e lançou Demi e os Jonas ao estrelato. Se antes não passavam de novatos, hoje esses jovens cantores atores são milionários e arrastam fãs a seus espetáculos. No momento, fazem um turnê pelo continente. Jonas, Demi e parte do elenco do filme virão ao Brasil em novembro para três apresentações (no dia 6 em São Paulo, 7 no Rio de Janeiro e 10 em Porto Alegre). Em maio de 2009, os Jonas e a Demi encheram a Apoteose no Rio e o estádio do Morumbi em São Paulo.
Eles falaram sobre o Brasil na entrevista que concederam a ÉPOCA, horas antes da pré-estreia. "Nossos fãs brasileiros querem que a gente volte", diz Kevin Jonas, de 22 anos, o mais velho da banda e recém-casado. "O Brasil é uma das praças mais entusiasmadas com a gente", diz Joe, de 21 anos. "Nossa antiga babá é brasileira e mal podemos esperar para voltar para lá", diz Nick, de 18 anos. Demi Lovato, também de 18, voltou ao país no início do ano para um show solo. "Adoro as pessoas, a comida e o calor do público." Os Jonas acabaram de lançar o quinto álbum em seis anos de carreira, Jonas L.A. - nome da série que estreará no Disney Channel no dia 10 -, e já acumulam 8,5 milhões de cópias vendidas mundialmente. Foram pioneiros no Twitter, onde têm 3 milhões de seguidores. Demi lançou em 2008 o primeiro álbum, Don't Forget, que figurou na lista da revista Billboard. No Twitter, conta com um séquito de 2,3 milhões de fãs. Os quatro superastros são comportados, vetem-se com grifes esportivas e falam frases tão bem sincronizadas quanto suas coreografias e canções - treinadas nas filmagens de "Camp Rock 2", com ensaios que duravam até oito horas por dia, sob o comando do diretor Paul Hoen e do bailarino Rosero McCoy.
"Trabalho duro é o preço que a Disney cobra para tornar você famoso", afirma a atriz Meaghan Martin, a vilã Tess no novo musical. "O problema é que você gasta a carreira vivendo um estereótipo. Fiquei marcada como a lourinha má, sem conseguir mudar de papel. Estou saindo. Vou trabalhar com David Lynch", diz, mencionando o diretor de filmes experimentais. Demi não quer romper tão cedo: "Estou feliz com tudo o que conquistei". Ela se diz bem menos ingênua que a personagem que vive no filme, a pobre menina que vira estrela: "Sou fã da heavy metal e procuro incentivar as jovens a conquistar o poder no trabalho e na vida". Os Jonas também vivem uma fase de mudança. Já não usam o famoso anel da pureza nem querem falar de virgindade. "Por enquanto, Danielle (mulher de Kevin) acompanha a gente", diz Nick. Os irmãos planejam carreiras solos, sem desfazer a banda: Kevin pretende produzir outros músicos. Nick acaba de lançar um CD solo, em estilo retrô, e Joe quer virar comediante. Como chegou a hora da renovação do Camp Rock, o irmão mais novo dos Jonas, Frankie, de 9 anos, conhecido como Jonas Bonus, passa a integrar o elenco. "Haverá um terceiro filme, e nós vamos aparecer só como convidados", diz Joe. "Não dá para viver eternamente em um acampamento de verão."
A Disney continua a forjar novas gerações de artistas. Mas, enfim, o que é mais importante para os estúdios, a fama ou a inocência? "Camp Rock 2" sugere que ela tenta harmonizar visão de mercado e fé nos bons princípios. Ao cativar o público infantojuvenil, ajudou a sustentar a indústria da música em um momento de decadência. Imbuída da transmissão de uma certa ética cuja força se esvai tão logo os jovens viram adultos, a Disney movimenta centenas de milhões de dólares com seus filmes, discos, excursões... e sonhos.
Matéria: Época