Este jornalista que escreve nem é tão alto assim. Mas seu 1,83 m foi suficiente para o estudo antropológico realizado no show de Miley Cyrus em São Paulo, no último dia 14.
Com a média de altura do público ao redor de 1,50 m, não é difícil, no meio da multidão, causar protestos por atrapalhar a visão do palco. As reclamações sintetizam os dois maiores grupos que vão a um show de Cyrus.
Se a moça que teve a visão tapada se dirige ao pai com voz chorosa dizendo “paiê, me põe no ombro?”, ela é uma hannah-montanete: tem seus 8 ou 9 anos e se veste feito personagem da Disney, mimetizando Cyrus na sua fase mais infantil.
Esse grupo se caracteriza pela obrigatória bandana com o nome da cantora, pelos gritos estridentes e pelo choro emocionado de “é o melhor dia da minha vida”.
Já se a moça reage com um palavrão pouco publicável ou tentando tirar o repórter do caminho com o braço, ela está mais grandinha: com seus 14 ou 15 anos, se veste como Cyrus já na fase inocência perdida. A minissaia reina nesse grupo, mesmo com o frio.
Elas já não têm mais gritos tão agudos, embora um ou outro escape. Chorar nem pensar, porque borra a maquiagem.
Tanto bandanas quanto minissaias vão à loucura quando Cyrus canta “Party in the USA”. Só não se empolgam muito quando ela canta “Smell Like Teen Spirit”, do Nirvana.
Aí é a vingança dos pais, que comemoram por ouvir ao menos uma versão meia boca de algo conhecido.
Os pais são nosso terceiro grupo, já no curso intermediário. Haja amor: Carlos Gomes, 47, gastou R$ 5 mil para trazer filha e afiliada, ambas com 11, de Fortaleza.
Gustavo Reis, 39, de Salvador, gastou uns R$ 2 mil para trazer a filha de 9. Com uma camiseta do Linking Park (“para não perder a identidade”), ele se consola: “Mas em setembro eu vou assistir o Motorhead no Rock in Rio!”.
Por último, temos, no nível avançado, os raros meninos do público. Se dividem em dois grupos.
Um é a turma do “tava lá em casa, não tinha nada para fazer”. Como Francisco, 10, garoto com jeito cativante que diz que só foi ao show porque acha Cyrus bonita. “Fui no Paul McCartney, gosto mais dele”, esnoba. A mãe, Isabel Pestana, 43, que acompanhava mais três crianças, responde: “E aquele DVD que te dei?”. “Ah, era para a minha irmã.”
O outro grupo é de garotos como Kaio Hoeflinger, 19. Ele veio de Curitiba sozinho, foi para a fila às 8h da manhã sozinho e sozinho cantou todas as músicas junto à grade. “Tem gente que diz que é coisa de menina, mas eu não ligo.”
No fim, todos sairam dizendo que gostaram. Tudo bem que Cyrus mais joga o cabelo para a frente do que canta (ah, se curtisse heavy metal), mas ninguém foi lá esperando ver o Led Zeppelin, certo?